A fibromialgia é uma doença que assola grande parcela da população economicamente ativa do Brasil. Por isso, muitos trabalhadores acabam tendo que se afastar do trabalho em razão da moléstia.
O problema é que trata-se de uma doença de difícil comprovação e, consequentemente, o INSS tende a negar a maioria dos benefícios por incapacidade requeridos pelos segurados portadores de fibromialgia.
Para lhe ajudar a driblar essas estatísticas e obter êxito em demandas desse tipo, resolvi dedicar um artigo completo para explicar a Fibromialgia na Ótica da Perícia Médica Previdenciária.
Pronto para se tornar um advogado águia? Então vamos começar!
Sumário
- O impacto da Fibromialgia na sociedade
- O impacto da Fibromialgia nos benefícios por incapacidade
- O que é a Fibromialgia?
- Fatores de risco de natureza ocupacional
- Dificuldades periciais
- Tipos de benefícios previdenciários
- Conclusão
- Referências
O impacto da Fibromialgia na sociedade
Geralmente, os advogados não se preocupam tanto em discorrer sobre a enfermidade do cliente na petição inicial, pois consideram que é mais importante mencionar as leis e focar na questão das provas.
Não que a legislação não seja importante, mas o advogado deve levar em consideração que o Juiz não possui conhecimento a respeito de todas enfermidades existentes.
Desse modo, recomendo que o advogado traga na petição inicial o conceito básico da doença e também como a referida moléstia acomete os trabalhadores de nosso país, citando inclusive estudos científicos e dados de pesquisas.
Contudo, não tenha como objetivo ensinar sobre a enfermidade, mas apenas procurar estabelecer um contexto da enfermidade perante a sociedade.
Especificamente com relação ao assunto do presente artigo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 2,5% da população mundial, ou seja, 150 milhões de pessoas sofrem de fibromialgia.
De acordo com a Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), no Brasil, há cerca de 4 milhões de pessoas com a doença, sendo que cerca de 75% a 90% dos afetados são mulheres, e os primeiros sintomas costumam surgir entre os 30 e 55 anos de idade (embora atinja também crianças e idosos).
“Dr. Marcelo, existe uma razão para a doença atingir mais mulheres?”
Apenas para você ter uma ideia, de cada 10 pessoas com fibromialgia, 7 a 9 são mulheres.
Infelizmente, não existe uma explicação científica que justifique o fato de a doença afetar mais as mulheres do que os homens.
Ademais, a fibromialgia é a principal causa de dores crônicas no Brasil e é uma doença considerada como de difícil comprovação, o que acaba gerando um um alto índice de indeferimento de benefícios previdenciários requeridos em razão da moléstia
Além disso, os portadores da enfermidade podem apresentar perda de produtividade laboral em razão do presenteísmo (situação em que a pessoa não está se sentindo bem, mas decide trabalhar mesmo assim, o que reduz a produtividade da empresa) ou sofrer com o desemprego, em virtude do absenteísmo (ausência no trabalho).
Dentre os principais sintomas que podem dificultar o bom desempenho laboral dos portadores da doença, destacam-se: dor, fadiga, depressão, ansiedade, distúrbios do sono e déficit cognitivo.
Nesse contexto, é possível levar em consideração como fatores para predisposição de incapacidade laboral:
- Elevada carga horária de trabalho;
- Elevada carga física de trabalho;
- Baixa autonomia no trabalho;
- Baixo nível educacional;
- Idade avançada;
- Gravidade da doença; e
- Baixa capacidade funcional.
Além disso, apenas a título de informação, saiba que o Governo Federal instituiu 12 de maio como o Dia Nacional de Conscientização e Enfrentamento da Fibromialgia, objetivando conscientizar e incentivar o tratamento da doença, visto que trata-se de uma enfermidade que atinge uma grande parcela de brasileiros.
O impacto da Fibromialgia nos benefícios por incapacidade
Como mencionei, há 4 milhões de pessoas com fibromialgia no Brasil. Porém, infelizmente, os benefícios previdenciários que são requeridos em razão da doença apresentam um alto índice de indeferimento.
A enfermidade, pelas confusões diagnósticas que suscita, pode resultar em múltiplas visitas médicas e mal uso dos recursos de saúde, o que gera um impacto econômico e social relevante, que não deveria ser menosprezado.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Reumatologia, 9 a 26% das pessoas com fibromialgia não estão trabalhando em razão de incapacidade temporária ou permanente, o que corresponde a cerca de 360.000 a 1.040.000 de segurados do INSS.
Ademais, o diagnóstico precoce pode auxiliar no tratamento. Contudo, costuma ser muito difícil conseguir um diagnóstico tão rápido, o que acaba ocasionando um adiamento do tratamento adequado.
Por fim, vale a pena dizer que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n. 4.399/2019, que visa incluir a fibromialgia no rol das doenças que dispensam carência para o recebimento de auxílio-doença (atualmente chamado de benefício por incapacidade temporária) ou aposentadoria por invalidez (atualmente chamada de benefício por incapacidade permanente).
O que é a Fibromialgia?
A fibromialgia é uma síndrome clínica caracterizada por dores musculares intensas em razão do aumento da sensibilidade em várias regiões do corpo do indivíduo.
O mais comum é que o quadro se inicie com uma dor localizada crônica, que progride até atingir todo o corpo.
É comum o enfermo sentir mais dor ao final do dia, mas pode também sentir pela manhã. A dor é sentida nos ossos, na pele ou ao redor das articulações.
Estudos mais recentes evidenciam que pessoas com fibromialgia possuem uma maior sensibilidade à dor do que pessoas sem fibromialgia, ou seja, os pacientes com a doença são menos resistentes à dores.
Até o momento, não foi descoberta a causa da fibromialgia, mas é possível que ela surja após a ocorrência de eventos graves na vida da pessoa, como um trauma físico, psicológico ou até mesmo uma infecção severa.
Segundo a literatura médica, existem 18 pontos de manifestação da fibromialgia (que são conhecidos como “tender points”), nos quais o indivíduo pode sentir as dores decorrentes desta enfermidade:
- Parte frontal do pescoço: 2 pontos;
- Parte traseira do pescoço: 2 pontos;
- Parte superior do peito: 2 pontos;
- Parte superior das costas: 4 pontos;
- Dobra dos braços: 2 pontos;
- Região lombar: 2 pontos;
- Abaixo das nádegas: 2 pontos;
- Nos joelhos: 2 pontos.
Mas, além da dor, a fibromialgia pode apresentar os seguintes sintomas:
- Fadiga (cansaço);
- Sono não reparador (mesmo após dormir, a pessoa acorda cansada);
- Alterações de memória e atenção;
- Ansiedade;
- Depressão (a doença está presente em 50% dos pacientes com fibromialgia);
- Alterações intestinais (síndrome do cólon irritável).
Até o presente momento, não existe um exame específico para diagnosticar a fibromialgia. Contudo, há um exame chamado de termografia, que pode ajudar na identificação da doença.
Caso você não saiba, o exame de termografia é um método diagnóstico não invasivo que avalia a microcirculação e as fibras nervosas finas, isto é, existe o registro gráfico das temperaturas de vários pontos do corpo por detecção da radiação infravermelha. Esse exame ainda não é aceito como exame diagnóstico da fibromialgia.
Ademais, em geral, o médico solicita alguns exames de sangue, não para comprovar a fibromialgia, mas para afastar outros problemas que possam simular esta síndrome, ou seja, o diagnóstico da fibromialgia é realizado por exclusão.
“Dr. Marcelo, mas o Poder Judiciário aceita o diagnóstico por exclusão?”
Sim, o Poder Judiciário está aceitando o diagnóstico por exclusão, em razão de não existir um exame próprio para diagnosticar a fibromialgia, sendo preciso juntar todos os exames atuais para demonstrar que o diagnóstico foi por exclusão.
Contudo, se o médico realizar uma boa entrevista clínica, é possível diagnosticar a fibromialgia logo na primeira consulta e descartar outros problemas de saúde.
Na realidade, existem os seguintes critérios para obter um diagnóstico mais preciso:
- Dor por mais de três meses em todo o corpo: o sintoma mais importante da fibromialgia é a dor difusa pelo corpo;
- Presença de pontos dolorosos na musculatura: no mínimo 11 pontos, daqueles 18 que mencionei anteriormente.
Além disso, a fibromialgia faz com que o sono seja prejudicado e essa é uma queixa bem frequente, afetando cerca de 95% dos pacientes.
Assim, com o sono profundo (que chamamos de fase REM) interrompido, a qualidade do sono é comprometida e a pessoa acorda cansada, mesmo que tenha dormido por um longo tempo, isto é, o paciente não consegue alcançar o sono reparador.
Juntamente com a má qualidade do sono, há aumento da fadiga, da contração muscular e da dor.
Pessoas com fibromialgia também queixam-se muito de alterações de memória e de atenção, sendo que isso se deve mais ao fato da dor ser crônica do que a alguma lesão cerebral grave.
Em regra, para o corpo, a dor é sempre interpretada como um sintoma importante e o cérebro dedica parte de sua energia para lidar com esta dor. Desse modo, outras tarefas, como memória e atenção, acabam restando prejudicadas.
Para que você possa entender, os portadores da fibromialgia são tão sensíveis, ou seja, possuem uma sensibilidade ao toque tão grande, que muitos enfermos não toleram ser até mesmo abraçados.
Por fim, o tratamento da fibromialgia é realizado por meio farmacológico e não farmacológico.
Os remédios são utilizados para reduzir sintomas e proporcionar condições para a prática de atividades físicas. Já o tratamento não medicamentoso possui papel fundamental, sendo o exercício físico a estratégia mais respaldada pela literatura médica mundial.
A permanência no trabalho também apresenta um impacto positivo na saúde da pessoa portadora de fibromialgia, pois ajuda na manutenção da condição física e na prevenção de distúrbios psicológicos, tais como a depressão e a ansiedade.
Fatores de risco de natureza ocupacional
Diferentemente do que ocorre com a maioria das moléstias que tenho tratado em meus artigos e lives, a fibromialgia não se trata de uma doença ocupacional.
Segundo as Comissões de Fibromialgia, Dor e outras Lesões de Partes Moles e de Saúde Ocupacional da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), a fibromialgia não é doença ocupacional e não leva à incapacidade permanente.
Por isso, não é possível solicitar auxílio-doença acidentário e nem auxílio-acidente.
A SBR apenas define que a fibromialgia é uma doença dolorosa crônica.
Dificuldades periciais
A maior dificuldade pericial encontrada em relação ao segurado portador de fibromialgia é a ausência de exame complementar que evidencie a doença, pois não existe nenhum exame específico para constatar a condição
E essa ausência de exame complementar tende a dificultar a decisão do perito.
Por outro lado, a maioria das fraudes utilizam essas doenças difíceis de comprovar através de exames, como justificativa para o pedido de concessão de benefício por incapacidade.
Inclusive, sempre busque saber se seu cliente é realmente portador dessa doença, pois muitos clientes costumam fingir a dor para obter algum benefício do INSS.
Contudo, em face do caráter crônico da doença, negar o benefício ao segurado com fibromialgia, que realmente está incapaz para o trabalho, pode implicar em danos irreversíveis, dos pontos de vista pessoal e social.
Por isso, essas pessoas precisam estar representadas por advogados especialistas em benefícios por incapacidade. Entender a doença e saber comprovar a condição ao perito, faz total diferença nesses casos!
Tipos de benefícios previdenciários
Um dos papéis do advogado é analisar qual é o benefício previdenciário que será mais vantajoso a seu cliente.
Em regra, quando se trata de doenças que comprometem a capacidade laborativa de um trabalhador, existem muitas possibilidades de benefícios, a depender da relação da doença com o trabalho.
Contudo, como expliquei, o entendimento atual da Sociedade Brasileira de Reumatologia (SBR), assim como da literatura médica mundial, é que a fibromialgia não é uma doença ocupacional, nem leva à incapacidade permanente.
Assim, a pessoa com a enfermidade pode apenas solicitar o auxílio por incapacidade temporária previdenciária (auxílio-doença)
“Mas, Dr. Marcelo, não é possível nem mesmo a concessão de aposentadoria por invalidez?”
Não, pois a fibromialgia oscila entre períodos de crise e períodos de melhora, o que exclui a possibilidade de aposentadoria por invalidez.
Conclusão
No artigo de hoje, busquei trazer as principais informações que os advogados precisam saber sobre a fibromialgia na ótica da perícia médica previdenciária.
Trata-se de uma doença complexa e de difícil comprovação, infelizmente. Portanto, o advogado previdenciarista possui um papel muito importante nesses casos, principalmente na hora de argumentar e utilizar o diagnóstico por exclusão como prova.
Por fim, lembre-se de que a fibromialgia não é classificada como doença ocupacional e nem leva à incapacidade permanente.
E se você realmente almeja se tornar um advogado águia e dominar as ações de benefício por incapacidade, lhe espero no Curso Perícia Médica Sem Segredos!
Referências
Quais são os direitos assegurados para o trabalhador que possui fibromialgia?
Entenda a fibromialgia, doença que afeta 150 milhões de pessoas